quarta-feira, 16 de abril de 2008

31

Uma fotografia, para mais tarde recordar. Vinte e cinco anos mais tarde, para ser mais exacto. Ou mais ou menos, já não sabe bem.
Ele, vejam lá, ainda com cabelo, ainda sem barriga. Bons tempos.
...bons tempos...
E o Armando, sorrindo.
Não havia de sorrir, o cabrão?
Tinha sido um bom dia, depois de uma boa noite, e a vida no exército era fácil. Já tinham acabado as guerras e as revoluções. E ali estavam eles, dois alegres magalas, frente ao quartel, vivendo os bons tempos.
É disso que ele se quer lembrar, dos bons tempos. Está tudo ali naquela fotografia, no cigarro que uma das mãos dele segura, na mão do Armando sobre o seu ombro.
O mal dos bons tempos é uma pessoa não saber com certeza se os tempos são os bons quando os vive. Com os maus é mais fácil, nota-se logo. Mas é preciso viver uma merda de cinquenta anos para depois conseguir olhar para trás e perceber que afinal só dois ou três é que valeram a pena e o resto andou tudo pelo assim-assim.
Não é que ele seja um desses mariconços nostálgicos. Cagando e andando, é mais o seu lema. Mas a alguma memória tem uma pessoa de se agarrar. Nem que seja uma fotografia roubada. Que nem é roubo, convence-se, enquanto fecha a caixa o melhor que a fita-cola ainda deixa. Aquilo é mais seu que do Jaquim. O Armando foi sempre mais seu do que de qualquer outra pessoa. E essa é uma dádiva que ele, desde que olhou para trás e viu quais tinham sido os bons tempos, aprendeu a apreciar. Mesmo que agora já seja um bocadinho tarde. Vinte e cinco anos, mais ou menos.

Sem comentários: