domingo, 24 de fevereiro de 2008

15

Não saberia dizer o que mudou, mas deve ter sido algo dentro de si. A vila ainda é a mesma. O autocarro passa as bombas da gasolina, o largo da igreja, a escola primária. Novo é o bairro social, o polidesportivo, a rodoviária. Mas é tudo o mesmo. Ele é que é outro. Ele já não mora ali.
A porta pneumática abre-se para deixar sair os passageiros e deixa entrar um cheiro que o perturba por ser tão familiar. Para lá dos travões e do gasóleo há campos. Sol na cal das casas e mais coisas que nem têm nome para dar a um cheiro, mas que ele reconhece. Não são só recordações que se abatem súbitamente sobre ele. É uma solidão imensa.
Põe a mochila às costas. Dali sabe ir ter a casa da menina Ivone, subindo a rua. Lá para baixo é o campo de futebol, vazio a esta hora. Amarelo, laranja quase, o pó. Nunca foi bem terra batida que terra daquela não se deixa bater.
E agora Jaquim? Sobes a rua, olhas em volta, que fazes aqui?
A mochila pesa mas já não é longe. São duas ruas. Desertas quase, não fosse os cães. Olham para ti apenas, deitados à sombra, língua de fora, com perguiça de ladrar. Ali é a loja do Sr. Alcides. E há um clube de vídeo novo. E um café também. E virando a esquina, aqui está o largo, a escola primária, a casa com os azulejos por cima da porta. Santo António. E sabes que se desceres a outra rua vês outra casa, a que foi tua. A vossa casa.
Que desejo palerma este, de voltar para casa quando casa já não se tem.

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